Rei Ri Saho – Etiqueta, decoro e conduta. (regras de conduta)
1- Sempre que seu professor estiver dando uma explicação, olhe para ele o tempo todo. A menos que ele mande olhar em outra direção, permaneça olhando para ele, não se distraia, não converse com outro aluno, não tente fazer o movimento antes que ele dê o sinal de início, quando o professor começar a falar alguma coisa, pare imediatamente de fazer o que quer que você esteja fazendo e escute. Nos mosteiros e templos Zen, fala-se muito pouco, as instruções são na maioria das vezes efetuadas em silêncio, apenas uma vez por semana são dadas explicações formais sobre algum assunto que não esteja a contento dos professores, assim quando algum professor fala alguma coisa todos o ouvem com muita atenção. Toda prática Zen se inicia com um som, existem cerca de 14 tipos diferentes de sinos, cada um com uma finalidade, que vai desde informar cada meia hora como chamar para o almoço, para a meditação etc., faz parte do treinamento Zen: ao ouvir o som do sino, parar imediatamente o que estiver fazendo e dar cumprimento ao que é solicitado, não permitir que seu ego inchado considere que o que você está fazendo é mais importante que o assunto para o qual lhe chamam.
2- Ao cumprimentar em pé (hitsurei), colocar os pés juntos e as mãos ao lado (homens) ou à frente das coxas (mulheres) com os dedos juntos e dobrar a coluna no máximo 45 graus olhando para os pés num tempo aproximado de 5 segundos e depois voltar a posição normal. Ao efetuar o cumprimento demonstre claramente que você tem pressa em demonstrar seus respeitos (curve-se rápido), mas não tem pressa em parar de demonstrá-lo (retorne a posição de forma bem lenta). A distância entre você e quem você cumprimenta deve ser de 3 a 5 passos, olhe para o chão, nunca para o rosto de alguém de hierarquia superior. Não estabeleça contato físico com alguém de hierarquia maior que a sua, a não ser que ele inicie o contato, por exemplo: aperto de mãos, abraços etc. No cumprimento, você deve se abaixar primeiro que seu superior e retornar depois dele. Não de esqueça que a espiga de milho quanto mais madura, mais abaixa a cabeça, nas salas de chá japonesas (chanoyu) todos tem que se abaixar para entrar, em razão da soleira ser bem baixa. Ao iniciar o treinamento com um parceiro cumprimentar e depois dizer: ONEGAI- SHIMASU (por favor, me conceda esse favor). Ao terminar, cumprimente novamente e diga: DOMO ARIGATO GOZAIMASHITA (muito obrigado).
3- Quando estiver conversando ou ouvindo alguma explanação de alguém que seja superior hierarquicamente a você, coloque-se de maneira respeitosa: Fique com os pés apoiados por igual, não coloque o peso do corpo em cima de uma perna ou outra, não fique trocando de posição, não coloque as mãos nos bolsos, na cintura nem fique estalando os dedos, não se encoste em paredes ou soleiras de portas, nunca fique num plano superior ao dele, mantenha os braços soltos ao longo do corpo ou cruze as mãos na frente do corpo ou atrás na posição de garçom. Não fique olhando em volta, prestando atenção em quem entra ou sai, ao escutar... faça apenas isso... escute e aprenda.
4- Quando em trajeto (deslocamento a pé) não é educado permitir que um graduado carregue malas, embrulhos ou bolsas, ofereça-se imediatamente para carregar seus pertences, mesmo que ele não queira aceitar, insista que ele acabará deixando. A recusa de ajuda é uma praxe. O aluno mais antigo (sempai) deverá andar à sua esquerda, ligeiramente atrás de seus passos, o segundo mais antigo deverá andar à direita e, o menos graduado deverá andar na frente, afinal o maior perigo sempre é aquele que vem pelas costas de onde não estamos preparados, por isso os mais graduados sempre devem andar um pouco mais para trás. Somente passe a sua frente para abrir a porta de um carro ou porta de algum lugar. Enquanto em deslocamento, não permitir que outras pessoas estranhas ao grupo interfiram entre o graduado e seus acompanhantes, seja quando eles estiverem andando, parados ou conversando em grupo. Nunca perguntar ou acrescentar alguma coisa sobre o assunto que eles estiverem conversando, mesmo que você tenha conhecimento de causa. Somente responder quando for perguntado e, mesmo assim de forma sucinta e econômica. Não tente demonstrar erudição, conhecimento ou inteligência, continue se esforçando, um dia você também será um mestre e terá oportunidade de demonstrar seus conhecimentos.
5- Comporte-se adequadamente, pois se você ferir o sutil código de etiqueta, decoro e conduta, quem passará vergonha é seu professor, que não soube te ensinar corretamente como se comportar.
Uma certa vez, quando um mestre Zen veio visitar o Centro Zen do Rio de Janeiro, eu educadamente me ofereci para carregar suas malas, na mesma hora percebi que ele tinha ficado um pouco sem graça, achei que cometido alguma gafe ou dito alguma coisa errada, pois a língua japonesa (nihon go) é cheia de formalismos, olhei para minha Mestra no Zen e vi que ela também não tinha ficado satisfeita. Pensei, onde foi que errei...estou sendo educado e ainda estou errando, deixei para lá pois sabia que na hora certa ela me diria onde foi que eu errei. Somente depois que o hospedamos no hotel é que a mestra me disse que eu era seu aluno e não dele, portanto não podia ter me colocado a disposição para levar suas malas, tinha que esperar que ela me pedisse para levar as malas dele, caso contrário deveria ter ficado calado e quieto ao seu lado. Esse exemplo é para todos poderem perceber o quanto sutil são as maneiras corretas de se proceder no Budo.
6- Acostume-se a efetuar o gesto formal de cumprimento (abaixar a cabeça) ao entrar e sair do Dojo (local de treinamento), ao encontrar o seu professor ou quando quiser lhe dirigir a palavra. A disciplina e a reverência sempre foram uma tônica nas artes marciais Japonesas. A reverência não é efetuada, especificamente, para a pessoa do professor, mas para o que ele representa.
7- Ao entrar no Dojo, coloque sempre os chinelos ou sandálias com as pontas nitidamente, apontadas para a parede. O relaxamento com as pequenas coisas demonstram uma mente descuidada e indisciplinada. É nas pequenas demonstrações de etiqueta que se conhece a verdadeira escola de Karate Tradicional e, não um amontoado de pessoas truculentas praticando violência gratuita e sem objetivo.
8- Nunca arrume seu Dogui ou Obi de frente para o professor, para o Butsudan (altar budista), para o Sumidan ou Kamidana (altar xintoista), para a imagem ou qualquer outra representação de qualquer um dos Patriarcas e Ancestrais do Karate. Este ato, em princípio despretensioso, demonstra grande falta de respeito e desconhecimento da tradição marcial japonesa. Quando um praticante de Karate se compõe (se arruma) ou se penteia de frente para o professor, deixa claro que se considera um igual, do mesmo nível e com o mesmo conhecimento que ele. Quando isso acontece à frente do altar (Butsudan/Sumisan) demonstra não conhecer nem respeitar o que eles representam.
9- Todas as vezes que algum aluno chegar atrasado no Dojo ou depois da aula já ter começado, rege a etiqueta que o aluno deve cumprimentar primeiramente o altar dos ancestrais assim que entrar no Dojo, ato contínuo, deve se encaminhar para a parte da frente da turma, nunca passando pela frente da turma ou entre o professor e o Butsudan e se colocar em pé ou em seiza ao lado do primeiro aluno da primeira fila e ficar olhando para o professor, esperando que ele o veja, lhe cumprimente e lhe conceda permissão para treinar, após o que você pode se aquecer e assim que houver uma primeira parada para descanso entrar na turma no lugar que sua graduação requer.
Ao chegar, deve o aluno cumprimentar o altar dos ancestrais, entrando pelo lado da porta que fica mais longe do altar, no caso de ser uma porta frontal, entrar com o pé esquerdo. Sempre que for entrar no Dojo deve, colocar um pé e depois o outro, até que um pé fique encostado no outro e efetuar um cumprimento, não é necessário falar a palavra Oss. Apesar de parecer muito complicado, não é, uma vez aprendido o aluno nunca mais esquece. No caso desse aluno que chegou atrasado ser um faixa preta formado pelo professor daquele Dojo, não é necessário ficar em pé ou em seiza, esperando a autorização do professor para começar a treinar, esse aluno já tem prévia autorização para chegar atrasado, entende-se que ele tenha uma espécie de "reconhecimento marcial" inclusive, se a aula for apenas de iniciantes, ele também tem autorização prévia para ficar afastado treinando o que achar mais conveniente, até que o professor lhe diga o que treinar.
10- Não mostre a sola dos pés descalços ou não, para o Professor, para o altar dos ancestrais (butsudan) ou para qualquer retrato dos Ancestrais ou patriarcas. Os japoneses e chineses consideram os pés sujos e impuros (Por estarem em contato com o chão), deste modo, este ato é tido como grande falta de respeito e educação. Uma das primeiras alterações que a China efetuou na prática budista foi a de não se sentar diretamente no chão, como faziam os Indús e, sim sobre um acolchoado, por considerarem os pés sujos.
11- Evite, (Ainda que se saiba da curiosidade presente na nossa sociedade ocidental) fazer qualquer tipo de perguntas que não se façam absolutamente necessárias, seja no decorrer da aula ou fora dela. O professor sabe exatamente quais informações deve prestar, quando prestar e para qual aluno. Lembre-se na prática do Karate: “Não ha nada escondido que não lhe seja mostrado nem nada oculto que não lhe seja revelado.
12- Dirija-se ao professor sempre de maneira educada e respeitosa. Todo o seu avanço na prática do Karate deve-se a seus ensinamentos. O professor tem por objetivo maior ensinar ao aluno disciplina marcial, segundo os princípios e ditames da filosofia Zen, tornando-o apto a ser um homem de bem, dotado de capacidade de direção, comando, coordenação, controle e capacidade de decisão.
13- A prática do Karate deve sempre ser efetuada com um espírito Ishinryu Mushotoku (sem almejar resultados, com a mente livre de objetivos que não sejam puramente a prática pela prática).
14- A formalidade do aluno dentro do local de prática (Dojo) é que lhe permite conservar a harmonia e a tranqüilidade em todos os momentos e situações da vida.
Durante a prática do Karate o discípulo é condicionado a comportamentos e posturas enérgicas e firmes, porém com gentileza, educação e disciplina, como cabe a cidadãos educados. Dai a importância do respeito no trato com o professor e seus colegas de prática.
15- É através da ritualística e da etiqueta que sem perceber o praticante é treinado para o “Modus Educandus” e as formalidades indispensáveis aos homens que vivem em sociedade.
O mais importante da prática não é chegar a algum lugar, ser melhor, mais competente ou sair-se vitorioso em campeonatos ou torneios, mas descobrir o potencial individual e a energia latente que habita todos os seres vivos. É o Budo o bridão que segura nossas emoções externas; Que organiza a hierarquia dos praticantes; Que não permite o deslize, a arrogância e a grosseria; Que preserva a tradição e a mantém com o passar dos anos; É ele que produz para a comunidade e, naturalmente para a sociedade um homem educado, competente e produtivo.
16- A prática do Karate deve ser entendida e praticada como um ato quase que sagrado, cada aula que se encerra nos coloca um pouco mais próximos do fim do Caminho.
A apresentação pessoal deve ser como a de quem se encontra indo a um lugar de cerimônia, por isso, sempre que possível: Apresente-se: de banho tomado, de barba feita, com a roupa de prática limpa e passada, com os cabelos penteados, com as unhas limpas e aparadas (pés e mãos) sem o uso de maquiagem, perfumes fortes e desodorantes de odor doce, dentes limpos, sem adereços ou enfeites barulhentos de qualquer tipo (brincos, pulseiras, anéis, cordões, gargantilhas etc).
“Um copo não se enche estando acima da jarra, uma pessoa ao se curvar aceita na pessoa que se curva conhecimento superior ao seu e respeita o que ela representa.” Sensei Juichi Sagara
Oss!
Getulio Taigen
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